O silêncio da elite brasileira por Luana Soares |
Wednesday, 07 August 2013 23:31 |
O caso de Amarildo, em especial, repercutiu a partir das mobilizações ocorridas na Favela da Maré, e também por este ter sido avistado pela última vez, entrando na Sede da UPP-Unidade de Polícia Pacificadora, da Favela da Rocinha. Ou seja, foi visto, foi identificado por pessoas próximas, deixando ao menos um rastro para que amigos e familiares pudessem segui-lo.Após, semanas de desaparecimento, a família já começa a pressionar a Prefeitura do Rio, para que se reconheça a morte de Amarildo, um pai de família, trabalhador e negro.Amarildo, é mais um, dentre milhares, e milhares de negros mortos todos os dias. O último Mapa da Violência, realizado pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americano, apontou uma queda considerável no número de homicídios ocorridos entre a população branca (queda de 26,4%) e um aumento no numero de homicídios entre a população negra (aumento de 30,6%), ou seja o número de homicídios ocorrido entre a população branca cai de 41% (2002) para 28,2% (2011), enquanto na população negra essa taxa, que já era bastante elevada, vai de 58,6% (2002) para 71,4% (2011). Estatísticas são números frios. Mas são importantes. Inclusive, o fato dos Mapas da Violência, trazerem o recorte de raça e gênero, é resultado da pressão dos movimentos sociais que desde a década de 80 vem denunciando o extermínio/genocídio da Juventude Negra. Uma outra estatística bastante interessante reflete um pouco sobre como se dá esse aumento da morte entre a população negra. A ONG Human Rights Watch (HRW) apresentou que 95% das pessoas feridas em confrontos policiais no Estado de São Paulo morrem no trajeto ou então no Hospital. A ONG alerta também para a ação de policiais, que forjam resistência de modo a justificar as mortes ocorridas, inclusive alterando cenas do crime, para conseguir um “auto de resistência”. O que é importante refletirmos é o sistema racista, que está por trás de todos esses números e mortes, como foi a de Amarildo. Não foi um governo, uma eleição, ou uma entidade que inventou isso. O Brasil é um país que nasceu e se estruturou economicamente e socialmente em cima de uma política genocida e escravista, primeiro com as comunidades indígenas e posteriormente, com a população negra. Excluindo todos aqueles que fossem considerados como um entrave a criação de um Brasil eurocêntrico, de cara e raízes brancas, invisibilizando-os, deixando-os à margem da sociedade, até que sejam “resolvidos” pela ação da PM, pela exclusão das Universidades, pela falta de assistência médica, pelo Racismo Institucional. Nesse sentido, o PL 4471/2012 , que prevê o fim do Auto de Resistência, é de extrema importância. O auto se constitui em um instrumento jurídico, que legisla sobre homicídios ocorridos durante o trabalho do policial, dessa forma uma pessoa morta em confronto com a policia, é enquadrada no quesito “resistência seguida de morte”. Seu uso indiscriminado vem sendo denunciado por diversas entidades dos movimentos sociais, com o fim do auto, todas as mortes ocorridas durante o trabalho do policial, deverão ser investigados, quebrando com uma justificativa histórica para a violência policial. Além disso, o PL prevê sobre o transporte de feridos durante o confronto, sendo que o autor do disparo deverá chamar assistência médica, ao invés do mesmo prestar assistência. Acima de tudo, a aprovação do PL 4471/2012, é importante por responsabilizar o Estado. É fazer, com que as mortes ocorridas nas favelas do nosso país, não sejam apenas uma estatística, mas passe a ter nome, sobrenome, local do ocorrido, fotos, exame pericial e principalmente culpado, seguindo os princípios das Nações Unidas para a prevenção efetiva e investigação de execuções sumárias, arbitrárias e extralegais, que foi adotado em 24 de maio de 1989.É um grito de milhares de mães, pais, avós, avôs, irmãos, irmãs negros e negras, de que a morte de seus familiares tem culpado, e que esse culpado tem que ser responsabilizado. Pensar o quanto o/a negro/a é objeto de descarte nesse país (e como sempre foi), conhecer as estatísticas, ajuda a compreender o silêncio da Elite brasileira, em relação ao Amarildo, ao fim do Auto de Resistência e a todos os outros 122.570 jovens negros que morreram entre 2002 e 2010, aos 360 que morreram nas Viaturas e Camburões Paulistanos em 2012, bem como do Massacre do Carandiru, Candelária e Vigário Geral (1993); Alto da Bondade (1994); Corumbiara (1995); Eldorado dos Carajás (1996); São Gonçalo e Favela Naval (1997); Alhandra e Maracanã (1998); Cavalaria e Vila Prudente (1999) entre tantos outros. Eliane Brum, Jornalista, escreveu em seu Blog um excelente texto com o título “Também somos o chumbo das balas”, onde alerta para este silêncio ocorrido com os mortos da Favela da Maré.Em determinado trecho ela afirma que: “É preciso que a classe média se olhe no espelho, se existe mesmo o desejo real de mudança. É preciso que se olhe no espelho para encarar sua alma deformada. E perceber que essa polícia reflete pelo menos uma de suas faces.”. A face da Elite Brasileira, é a face da Policia Militar, é a face do Genocídio/Extermínio da Juventude Negra.Uma face que está virada apenas para o próprio umbigo, e que deliberadamente vira as costas, para esses outros rostos que deixam de ser nomes para serem números. O que causa a violência, é a desigualdade, é a ação do sistema capitalista que se alimenta do racismo, do machismo, da homofobia, para legitimar a exclusão. É preciso não apenas repensarmos a Polícia.A desmilitarização é um bom caminho, mas não é o único. É preciso repensar a nossa sociedade.Compreender que são os privilégios da elite branca brasileira, que continuam a alimentar a ação racista e violenta da Policia Militar, e que esta age de forma a garantir a continuidade destes privilégios, eliminando os indesejáveis e se constituindo como um crime perfeito, usando as palavras do grande mestre Kabengele Munanga. É ir quebrando, em todas as instâncias, as cadeias elitistas que barram o acesso do povo preto ao poder.Em diversos fronts, mas com um objetivo em comum. Até que “ver o pobre, preso, morto” não seja mais cultural,e sim um crime. 95% dos feridos transportados pela polícia morrem no trajeto, in:http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/95-dos-feridos-transportados-pela-policia-morrem-no-trajeto Luana Soares é militante da CONEN, Executiva Estadual da Juventude do PT da Bahia e militante da Esquerda Popular Socialista do PT. |
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