A força política da esperança face à situação atual. Por Leonardo Boff |
Cidadania | |||
Monday, 05 June 2017 04:40 | |||
Houve um golpe da classe dos endinheirados, ameaçados em seus privilégios pelos beneficiados pelas políticas sociais dos governos do PT que os levou a ocupar lugares dos quais estavam antes excluidos. Usaram para isso o parlamento, como em 1964, os militares. A deposição da presidenta Dilma eleita democraticamente serviu aos propósitos destas elites econômicas (0,05% da população segundo o IPEA), que implicava ocupar os aparelhos de Estado e assim garantir seu status histórico-social feito à base de privilégios e de negociatas. Tendo naturalizado a corrupção, não tiveram escrúpulos em modificar a constituição e introduzir reformas que tiraram direitos dos trabalhadores e modificaram profundamente os benefícios da Previdência. A corrupção primeiramente detectada pelos órgãos de espionagem dos USA e repassada ao nosso sistema jurídico, permitiu instaurar um processo judicial que levou o nome de Lava-Jato. Aí se detectou a trama inimaginável de corrupção que atravessa as grandes empresas, das estatais às privadas, os fundos e outros órgãos, dentro da lógica do patrimonialismo. A corrupção identificada foi de tal ordem que escandalizou o mundo. Chegou a quebrar estados da federação como por exemplo o Rio de Janeiro. Junto com outros tantos, eu mesmo desde dezembro de 2016 estamos sem receber nossos proventos de professores universitários aposentados ou não. A consequência é o descalabro politico, jurídico e institucional. É falacioso dizer que as instituições funcionam. Todas elas estão contaminadas pela corrupção. A justiça é vergonhosamente parcial especialmente o justiceiro Sergio Moro e boa parte do Ministério Público, apoiados por uma imprensa reacionária sem compromisso com a verdade. Esta justiça revela sem peias uma fúria incontrolável de perseguição ao ex-presidente Lula e ao seu partido, o PT, o maior do país. A vontade é de destruir sua incontestável liderança, desfigurar sua biografia e, de qualquer forma, impedir que seja candidato. Força-se uma condenação, fundada mais por convicões do que por provas materiais, o que impediria sua candidatura que goza da preferência da maioria. A consequência é um sofrido vazio de esperança. Mas importa resgatar o caráter politico- transformador da esperança. Ernst Bloch, o grande pensador da esperança, fala do princípio-esperaça que é mais que a virtude comum da esperança. É aquele impulso que nos habita que sempre nos move, que projeta sonhos e utopias e dos fracassos sabe tirar motivos de resistência e luta. A Santo Agostinho, talvez o maior gênio cristão, grande formulador de frases, nos vem esta sentença: "a esperança tem duas filhas queridas: a indignação e a coragem; a indignação nos ensina a recusar as coisas como estão aí; e a coragem, a mudá-las". Neste momento devemos evocar, em primeiro lugar, a filha-indignação contra o que o governo Temer está perpetrando criminosamente contra o povo, contra os indígenas, contra a população do campo, contra as mulheres, contra os trabalhadores e contra os idosos, tirando-lhes direitos e rebaixando milhões que da pobreza estão passando à miséria. Nem escapa a soberania nacional, pois o governo Temer está permitindo vender terras nacionais a estrangeiros. Se o governo ofende o povo, este tem direito de evocar a filha-indignação e de não lhe dar paz, mas nas ruas e praças exigir a sua saída, pois é acusado de crimes de corrupção e fruto de um golpe e por isso carece de legitimidade. A filha-coragem se mostra na vontade de mudanças, não obstante os enfrentamentos que poderão ser perigosos. É ela que nos mantem animados, nos sustenta na luta e pode nos levar à vitória. Importa seguir o conselho do Quixote:"no hay que aceptar las derrotas sin antes dar todas las batallas". Há um dado que devemos sempre tomar em conta: a realidade não é apenas o que está aí à nossa mão como fato. O real é mais que o factual. O real esconde dentro dele virtualidades e possibilidade escondidas que podem ser tiradas para fora torná-las fatos novos. Uma destas possibilidades é evocar o primeiro artigo da constituição que reza:"todo o poder emana do povo". Governantes e políticos são apenas delegados do povo. Quando estes atraiçoam, não representam mais os interesses gerais mas os das empresas financiadoras de suas eleições, o povo tem direito de tirá-los do poder mediante eleições diretas já. O "fora Temer e diretas já" não é mais slogan de grupos mas das grandes multidões. A filha-coragem deve exigir, por direito, esta opção, a única que garantirá autoridade e credibilidade a um governo, capaz de nos tirar da presente crise. As duas filhas da esperança poderão fazer sua a frase de A. Camus:"Em meio ao inverno, aprendi que bem dentro de mim, morava um verão invencível". Artigo publicado originalmente em http://www.brasil247.com/pt/colunistas/leonardoboff/299466/A-for%C3%A7a-pol%C3%ADtica-da-esperan%C3%A7a-face-%C3%A0-situa%C3%A7%C3%A3o-atual.htm
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