Ela Wiecko: “Para punir os bandidos, os mocinhos também violam a lei”. Por Felipe Luchete |
Cidadania | |||
Friday, 01 September 2017 03:04 | |||
Ela Wiecko foi vice-procuradora-geral da República na gestão de Rodrigo Janot até agosto de 2016 e uma das oito candidatas para ocupar a vaga a partir de setembro deste ano. Convidada para evento promovido pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, afirmou nesta quarta que o processo penal de exceção ainda não é comum em todo o Ministério Público Federal, mas é visível no trabalho de colegas de Curitiba e, “em parte”, dentro da PGR. “O que foi feito nessas operações passou de alguns limites, algumas garantias individuais: da presunção da inocência, da proteção da imagem, do devido processo que seja realmente equilibrado. Por que alguns processos andam mais depressa do que os outros? A gente não ganha nada com isso.” ![]() Alice Vergueiro/Divulgação A palestrante afirmou que tanto a “lava jato” como a Ação Penal 470, conhecida como processo do mensalão, se encaixam em sete características contrárias ao garantismo, formuladas pelo criminalista e professor Fernando Hideo Lacerda. Na lista estão a aplicação distorcida da teoria do domínio do fato e julgamentos de acordo com a “opinião pública(da)”, que segundo a subprocuradora transformam procedimentos em espetáculo e cumprem “interesses dos sistemas político e midiático”. Citando a filósofa Márcia Tiburi, Wiecko disse que a espetacularização do processo fabrica uma luta entre o bem e o mal: “para punir os bandidos que violam a lei, os mocinhos também violam a lei”. Para agradar a audiência, continua, desconsideram-se consequências sociais e econômicas e são vazadas informações sigilosas aos poucos, de acordo com interesses. Ela também criticou conduções coercitivas, por entender que a prática “não está alcançada nas regras legais”, e disse que a seletividade do processo penal — comum no sistema brasileiro — tem sido ampliada para escolher o tempo em que cada investigado será alvo de operações. Segundo a palestrante, o processo penal de exceção originou-se no Brasil a partir dos anos 1990, com especialistas que queriam estender a Justiça penal para classes mais privilegiadas: nas bases ideológicas desse entendimento, destacou o juiz federal Sergio Moro e o criminalista gaúcho Luciano Feldens. O problema, na visão dela, é que a aplicação do princípio “simplifica as coisas” ao avaliar que a impunidade é sempre causa da corrupção. “O Ministério Público, se quer atuar na história da teoria econômica do Direito, tem que atuar de forma regrada, não pode ter pena negociada caso a caso. No que se refere ao acordo de leniência, a participação do Ministério Público faz com que a instituição entre na regulação da economia. A gente quer isso? Isso está na Constituição? Isso precisa ser claramente discutido. Tudo o que aconteceu até agora mostra que temos de enfrentar o problema de estabelecer democracia no país.” Ela Wiecko declarou ainda que a operação italiana mãos limpas, que inspirou a “lava jato”, acabou posteriormente tendo procedimentos de exceção aplicados aos mais pobres, como suspeitos de tráfico de drogas. Código flexível ![]() não resolveu problema da violência Alice Vergueiro/Divulgação Ele afirmou que, como diz o juiz Alexandre Morais da Rosa, cada vara do país adota hoje um Código Penal próprio. Embora considere comum a existência de juízes contra legem, Miranda Coutinho disse que tribunais superiores passaram a fazer “vista grossa” para condutas irregulares. “Agora não tem mais controle”, reclamou. “Trânsito em julgado não é nem mais trânsito em julgado.” Segundo o professor, a busca por mais punição desde os anos 1990 gerou apenas mais medo da violência, sem resultados positivos.
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