Ricos e seus luxos: Quem pagará? Às custas de quem? Por Bresser-Pereira |
Cidadania | |||
Monday, 03 September 2018 06:47 | |||
São os muito ricos, são os defensores do liberalismo econômico vigente no Brasil desde 1990. Mas em troca essas elites, que pensam educar seus filhos para serem semideuses, oferecem o desenvolvimento econômico que beneficia a todos? Não é o que leio na mesma Folha, onde a repórter Erica Fraga nos informa que “o governo Temer termina marcado pelo pior ciclo de crescimento em cem anos”. Estudo do economista Fernando Montero mostra que na atual década (2011-2020) a expansão média do PIB por habitante estará próxima de zero. Desde 1980, o PIB cresceu 1,6 por ano; o PIB por pessoa, portanto, cresceu menos do que um por cento ao ano. A economia brasileira está, portanto, semiestagnada há quase quarenta anos. Percebi este fato pela primeira vez em 1999, e escrevi um trabalho a respeito; voltei ao tema em 2007, ao publicar o livro, Macroeconomia da Estagnação, quando o boom de commodities levava a direita e a esquerda a acreditarem que “o Brasil voltara ao desenvolvimento”. Insisti no tema em 2014, quando o país entrava em grave recessão. Voltei ao tema no livro que acaba de ser publicado, Em Busca do Desenvolvimento Perdido. Enquanto isso, a direita sonha com os anos dourados de FHC, que na verdade foram de crise e baixo crescimento, e a esquerda, com os anos dourados de Lula, que só foram melhores porque havia um boom de commodities e um compromisso com os pobres. O Brasil não cresce desde 1999 porque suas contas macroeconômicas são deficitárias (a conta fiscal e a externa) e os seus preços macroeconômicos estão errados. Porque a taxa de juros é muito alta, a taxa de câmbio é apreciada no longo prazo, só se depreciando nos momentos de crise como a atual, e a taxa de lucro das empresas industriais é muito baixa quando não é negativa, impedindo que elas invistam e criem empregos. A taxa de lucro industrial é muito baixa porque a esquerda romântica acredita que câmbio apreciado garante bons salários para os trabalhadores, e porque a direita liberal está feliz com os juros que os muito ricos e a classe média tradicional, rentistas e financistas, recebem. Felizes mesmo estão apenas os muito ricos que mandam seus filhos estudar em escolas alienadas e muito caras e compram xampu de R$ 300,00. A classe média tradicional, que inocentemente apoia o liberalismo econômico reinante no Brasil (que é próprio das “pessoas de bem”) não se dá conta que essa forma de coordenar o capitalismo é essencialmente causadora de baixo crescimento e crescente desigualdade. A alternativa desenvolvimentista pode ser também causadora de semiestagnação, como aconteceu com o governo Dilma, mas se for uma política econômica moderada que garanta o equilíbrio fiscal, o equilíbrio da conta-corrente, e preços macroeconômicos certos, fará o Brasil voltar a crescer. Vemos esses pontos na política econômica proposta nos programas de Lula e Ciro Gomes. Se, adicionalmente, essa política for adotada com competência política, há uma esperança: os assalariados e a classe média poderão voltar a conhecer o desenvolvimento. Há aí, portanto, uma oportunidade – que não existe no caso do regime de política econômica liberal, que é dominante no Brasil desde 1990. Um governo liberal pode restabelecer o equilíbrio fiscal no Brasil, mas certamente não garantirá o equilíbrio cambial, porque seus economistas apostam no “crescimento com poupança externa” e na “austeridade”, a primeira causando do aumento do consumo e perda de competitividade das boas empresas industriais no Brasil (inclusive as multinacionais), a segunda sendo uma forma de fazer que o ajuste macroeconômico necessário seja pago apenas pelos assalariados, ao invés de ser dividido entre eles e os rentistas. Sim, os muito ricos pagarão por seu luxo, mas continuarão a fazê-lo às custas dos trabalhadores e das classes médias. E tendo como bandeira a liberalismo econômico. Assalariados e classes médias só realmente se beneficiarão se o Brasil, afinal, voltar a crescer com base em um projeto nacional de desenvolvimento que garanta o equilíbrio macroeconômico e promova a diminuição gradual da desigualdade econômica. Bresser-Pereira é economista e ex-ministro no governo FHC
|
Agenda |
Aldeia Nagô |
Capa |