O ano zero de Biden. Por Mathias Alencastro |
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Monday, 13 December 2021 05:05 | |||
A sua política econômica tem inspirado programas de governo ao redor do mundo, inclusive no Brasil. Nada mal para o líder do Ocidente, recentemente classificado como "decadente" pela ex-presidente Dilma Rousseff. No papel, Biden entregou quase tudo o que prometeu em 2020, quando anunciou que "os Estados Unidos estão de volta": uma máquina administrativa moderna e competente, um Estado modernizador, e uma América onipresente na arena global. Mas nada disso foi suficiente. A campanha de vacinação esbarrou na profunda fratura social. Os movimentos antivacina disputaram, e em alguns estados venceram, a "batalha pela alma da América", um dos principais temas da campanha do presidente. Os efeitos imediatos de sua política econômica estão sendo limitados por contingências, como o surto inflacionário, impasses políticos dentro e fora do seu partido, e mudanças inesperadas na sociedade. A ainda pouco explicada demissão de mais de 4 milhões de americanos desde agosto, ou seja, 3% da população ocupada, está provavelmente ligada a novos paradigmas nas relações de trabalho pós-pandemia. Um fenômeno difícil de assimilar para um presidente que sempre celebrou a América em que empresas e empregados viviam relações filiais e geracionais. Mas é na política externa, sua suposta área de expertise, que Biden mostrou toda a sua vulnerabilidade. A retirada do Afeganistão, uma decisão justa manchada por uma catástrofe humanitária, deu farta munição a rivais geopolíticos. O seu golpe contra a França nos contratos dos submarinos australianos reforçou a convicção da União Europeia de que a aliança do Atlântico Norte é algo do passado. Na COP de Glasgow, os Estados Unidos expuseram o abismo entre as aspirações dos tecnocratas e a realidade social na política climática. Quanto à Cúpula da Democracia da semana passada, Biden flertou com o ridículo. A partir de critérios definidos com a clareza de um porteiro de boate, o presidente americano convocou chefes de Estado que ele considera serem parte do campo democrático para discursarem sobre platitudes. Se a ideia de Biden era mostrar que a comunidade internacional apoia a política de contenção dos Estados Unidos contra a China, a Cúpula da Democracia foi uma demonstração de fraqueza em vez de força. Esse foi apenas o primeiro ano. No próximo, Biden enfrentará nas eleições de meio mandato a oposição mais antidemocrática desde que os escravocratas sulistas declararam a secessão contra Abraham Lincoln. Vladimir Putin se mostra decidido a fazer do conflito na Ucrânia um momento de verdade para as ambições globais americanas. Biden é uma raposa velha da política que conhece como ninguém o ritmo da presidência. Sua equipe é vista como uma combinação das mentes brilhantes da era Obama e da melhor geração da esquerda americana desde os anos 1960. Seu primeiro ano, no entanto, termina com a sensação angustiante de que o governo Biden já chegou ao limite das suas capacidades. Mathias AlencastroPesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC Artigo publicado originalmente em https://www1.folha.uol.com.br/colunas/mathias-alencastro/2021/12/o-ano-zero-de-biden.shtml
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